domingo, 25 de março de 2007

Um esboço sobre a epopéia cristera no México – Perseguição Laicista maçônica

Lic. Gustavo Carrère Cadirant



A perseguição liberal e maçônica contra a Igreja católica no México, que desencadeou a "Epopéia Cristera" no século XX, não era senão continuação da iniciada no século XIX.

Em 16 de setembro de 1810, no chamado "Grito de Dolores", o sacerdote Miguel Hidalgo y Costilla iniciava o processo de "guerra insurgente ou civil" que culminaria com a independência do México. Os bispos sustentavam que não se tratava de guerra pela independência senão, uma luta injustificada e selvagem contra uma classe da sociedade: a exaltação das turbas, conhecidas como os "chinacos", contra as classes altas da sociedade, conhecidas como os "gachupines". Não obstante, a burguesia "criolla" americana do século dezenove, ansiosa por libertar-se do poder da Coroa espanhola e da influência da Igreja Católica, se agrupou em lojas maçônicas locais, com intervenção dos franco maçons do norte anglo-saxão, que já então buscavam penetrar em solo ibero-americano. Em 24 de fevereiro de 1821, o "Plan de Iguala" decide a independência completa como monarquia constitucional e institui a Religião Católica como base espiritual da vida mexicana; o imperador Agustín de Iturbide ocupara o governo. Paralelamente, o "Manifiesto Destino" lhes assinalava aos governantes dos Estados Unidos o velho Oeste como meta; assim Texas, Novo México, a Alta Califórnia e Arizona entravam nos planos anexionistas. Por isso foi comissionado seu embaixador Poinsett, a formação de um "Partido Americano" no México; sobre a base das "logias yorkinas"; o projeto era "La República Federal y Laica". Com a colaboração de liberais maçons e os constitucionalistas, em 1824 Iturbide será destituído e fuzilado em Padilla. O Gral. Vicente Guerrero proclamará assim a República em 1824; se sanciona a Constituição. Começa um período de decadência: o separatismo centro-americano, a propaganda anti-religiosa, a guerra do Texas e a guerra contra os Estados Unidos, que culmina com o Tratado de Guadalupe, o 2 de febrero de 1848, que levou a perda de 50% de seu território -Texas, Novo México, Arizona e a Alta Califórnia -; a política exterior do México ficou assim subordinada aos Estados Unidos.


a. Presidência do Dr. Benito Juárez (1855-72)

Em 1855, se desata a revolução liberal com toda sua virulência anti-católica, quando assume o poder Benito Juárez, índio zapoteca, de Oaxaca, que aos 11 anos, com ajuda do leigo carmelita Salanueva, aprende castelhano e a ler e escrever, o que lhe permite ingressar no Seminário. Advogado mais tarde e político, impõe, obrigado pela loja norte-americana de Nova Orleans, a Constituição de 1857, de orientação liberal, e as Leis de Reforma de 1859, uma
e outra abertamente hostis a Igreja: algumas disposições específicas, entre as que sobressaíram: Artigo 3º: Elimina da Igreja a tarefa da educação; Artigo 13º: Ratifica Lei Juárez de 1855 que põe fim aos privilégios e tribunais especiais para Igreja; Artigo 27º: Ratifica Lei Lerdo de 1856 que proíbe a Igreja administrar bens ou empresas não destinadas ao culto religioso; Artigo 56º: Impede os sacerdotes de serem deputados; Artigo 57º: Impede aos sacerdotes aspirarem a Presidência da República; e Artigo 123º:Permite ao Governo controlar a prática do culto.
Seu governo deu também apoio a uma Igreja mexicana, precário intento de criar, em torno a um pobre padre, uma Igreja cismática. SS Pio IX condenou estas medidas; enviou um comunicado ao Presidente da República Mexicana de cujo texto tomamos um fragmento que diz: "levantamos nossa voz pontifícia com a liberdade apostólica para condenar, reprovar e declarar írritos e de nenhum valor os chamados decretos de reforma e tudo mais que haja praticado a autoridade civil com tanto desprezo da autoridade eclesiástica e desta Sé apostólica".
Este respaldo absoluto do Papa ao clero mexicano auspicio uma "resistência popular católica" nos anos 1858-1861, conhecido como a "guerra de três anos"; primeiro precedente da epopéia cristera. A catolicidade mexicana sustentou essa luta contra aqueles laicistas da Reforma, também jacobinos, que haviam imposto a liberdade de todos os cultos - exceto o culto católico, submetido ao controle restritivo do Estado -, pondo a venda os bens da Igreja, proibindo os votos religiosos, supressão da Companhia de Jesus e, portanto, de seus colégios, o juramento de todos os empregados do Estado a favor destas medidas, a deportação e a prisão dos bispos ou sacerdotes que protestaram e uma repressão sangrenta das manifestações de protesto, particularmente numerosas nos estados de Jalisco, Michoacán, Puebla, Tlaxcala; o governo liberal prevaleceu graças a ajuda dos Estados Unidos. Em 1860 Juárez expulsou do país todos os prelados estrangeiros, o que fez com que os conservadores pensassem em chamar um rei ou imperador da nobreza que os "acercara a Dios", para substituir ao presidente indígena que os estava "acercando al diablo".


b. Presidência de Sebastián Lerdo de Tejada (1872-76).

Este, que havia estudado no Seminário de Puebla, acentuou a perseguição religiosa. Com a restauração da República se aplicaram ao pé da letra as Leis de Reforma; em 20 de maio de 1873, o Governador do Distrito Federal, por ordens do Presidente arrestó a todos os jesuítas, assim como os freis, monjas e sacerdotes estrangeiros. O periódico subsidiado pelo Governo chamado "el federalista" em sua edição de 21 de maio de 1873 consignou textualmente: "os sacerdotes naturais do país seguirão purgando no cárcere sua desobediência as leis; as monjas não poderão voltar a consagrar-se e os sacerdotes estrangeiros, particularmente os jesuítas, serão desterrados do país como cidadãos perniciosos".
O governo federal decidiu reformar a Constituição, completando-a; o decreto de 25 de setembro de 1873, incorporava os cinco decretos, conhecidos como Leis da Reforma, a Constituição de 1857. Uma emenda constitucional decidiu pela expulsão das Irmãs da Caridade - a quem o mesmo Juárez havia respeitado -, não obstante que das 410 que havia, 355 eram mexicanas, que atendiam cerca de 15.000 pessoas em seus hospitais, asilos e escolas. Em troca, se favoreceu oficialmente a difusão do protestantismo, com apoio norte-americano; assim mesmo se proibiu que houvesse fora dos templos qualquer manifestação ou ato religioso. Tudo isso provocou outra "resistência (alzamiento) popular católico", chamado de os Religioneros (1873-1876), segundo precedente da epopéia cristera. Os primeiros levantamentos se produziram em novembro de 1873 em Morelia, Zinacatepec, Dolores Hidalgo, León; muito mais graves foram as tragédias em Jonacatepec, Temascaltepec e Tejupilco. Em janeiro de 1874, a "Epopeya religionera" se estendia aos gritos de ¡Viva la Religión! ¡Muera el mal gobierno! ¡Mueran los protestantes!
A cega repressão do governo produziu um maior apoio popular; em tal sentido apontavam: "A conduta dos chefes mandados pelo governo para sufocar a revolução é mais própria para avivar o incêndio que para sufoca-lo".
A frente desta guerra popular, verdadeira guerra de guerrilhas, se encontravam: Jesús González, Benito Mesa, Domingo Juárez, Gabriel Torres, Antonio Reza, Jesús Soravilla, Socorro Reyes. Os prelados, como em muitas ocasiões, não trabalharam de maneira uniforme; entretanto, uns recomendavam obediência as leis, outros incitavam contra o governo. O Gral. Porfirio Díaz derrubou a Lerdo de Tejada graças ao apoio popular; o movimento "religionero" desaparece, por não ter já razão de ser pois, Porfirio Díaz se apressou a pactuar com a Igreja Católica com o aval do Vaticano: o regime suavizaria a aplicação das Leias de Reforma se o clero se comprometesse a concentrar-se seu labor pastoral.

c. Presidência do General Porfirio Díaz ( 1877-1910)

Era, como Juárez, de Oaxaca e antigo seminarista; desencadeou uma revolução que o levou ao governo do México durante quase 30 anos: foi reeleito oito vezes, em uma sequência de fraudes eleitorais entre 1877 e 1910. O liberalismo do Porfiriato foi mais tolerante com a Igreja. Ainda que tenha deixado vigentes as leis persecutórias da Reforma, normalmente não as aplicava; mas as manteve em seu governo, especialmente na educação preparatória e universitária, o espirito laicista anti-religioso. Se mobilizou com audácia e obteve o apoio da Confederação Maçônica Internacional e do Supremo Conselho Mundial de Londres que enviaram emissários ao México dialogar com os integrantes das lojas, de cujas conversações se obteve a anuência da maçonaria universal para que o Gral. Porfirio Díaz atuasse em busca da paz e da reconciliação Igreja - Estado, com objeto de deixar o país em condições de estabilidade para a favorecer o investimento estrangeiro, os créditos e o progresso da nação mexicana. A conciliação proposta pelo governo consistiu em não combater as manifestações religiosas externas da Igreja, desde que esta colaborasse no sentido de colaborar com a conservação da paz. Sujeito ao acordo a conveniência mutua, as ordens religiosas foram restabelecidas, se abriram escolas e centros de ensino religioso, se mostrou tolerância aos atos de culto externo, se erigiram os bispados de Tabasco, em 1880; o de Colima, em 1881, e Sinaloa em 1883. Para 1895, o número de templos ascendeu a 9.580, aumentando em 4.687 em relação aos que existiam em 1878. O clero denominou esta época de tranquilidade e bonança "pax porfiriana" que foi muito comentada, controvertida e criticada. Sem embargo, os católicos conservadores manifestavam que não modificariam sua posição a respeito da legislação reformista, pois a consideravam um problema de consciência; portanto, continuava sua condenação ao que consideravam roubos sacrílegos dos objetos e propriedades eclesiásticas, a educação impartida pelo Estado e a secularização do matrimônio. Consolidado no poder o grupo liberal, se favoreceu a difusão do protestantismo, como base liberal radical no marco de seu confronto com a Igreja Católica. Com apoio do governo, se reproduziram as congregações reformistas protestantes, as que tinham como característica essencial oferecer ao indivíduo pautas e modelos organizativos, em ruptura com os modelos corporativos tradicionais, ligados em grande parte ao catolicismo.
Mas será a partir de 1910, com a denominada "Revolução Mexicana", a irrupção no panorama ilustrado de um socialismo e um marxismo ascendente, quando a situação alcançou seu ponto crítico: entre 1914 e 1917 os bispos foram detidos ou expulsos, os sacerdotes encarcerados, as monjas expulsas de seus conventos, o culto religioso proibido, as escolas religiosas fechadas, as propriedades eclesiásticas confiscadas. A Constituição de 1917 legalizou o ataque a Igreja e o radicalizou de maneira intolerável. No período de 1914 a 1934, o más cruento da perseguição religiosa no México, bispos, sacerdotes, laicos, homens, mulheres e crianças, ofereceram suas vidas ao grito de ¡Viva Cristo Rey! Teve ponto culminante de 1926 a 1929, quando o então Presidente da República, General Plutarco Elías Calles, promulgou uma lei sobre o culto, que levasse a prática as disposições da Constituição de 1917. Estas disposições, conhecidas como "Ley Calles", estabeleciam o número de ministros sagrados pela localidade, proibiam a presença de sacerdotes estrangeiros no país, limitavam o exercício dos atos de culto e, entre outras disposições, proibiam os seminários e conventos. Ante estas restrições, e por conta de frustrantes negociações por parte dos bispos mexicanos com as autoridades do Governo, a Igreja do México, em sinal de protesto, decidiu suspender os atos de culto.
A rebelião não se fez esperar: na parte ocidental do México (especialmente em Jalisco, Aguascalientes, Michoacán, Guanajuato e Colima), muitos católicos tomaram as armas para defender a liberdade religiosa. Alguns sacerdotes, ainda que em número exíguo, se uniram a eles; mas a maior parte optou por uma resistência pacífica. Os estudiosos contam só vinte sacerdotes entre os aderentes a luta armada. Entre os laicos se formaram dois grupos: os favoráveis a luta armada e os que se inclinavam pela resistência pacífica. Se tratava da Epopéia dos Cristeros, que, como seus irmãos de La Vendée, se formaram sob as bandeiras do Sagrado Coração: cerca de cem mil homens armados, apoiados pelas chamadas "Brigadas Bonitas"(mulheres que tomavam a seu cargo a sanidade, a intendência e as comunicações).
A Epopéia se desenrolou desde 1926 até 1929, em que se firma o Pacto Religioso entre o Governo e os Bispos, pelo qual estes acatavam a Constituição e se colocava fim a luta cristera. Apesar do decisivo apoio popular que levantavam os Cristeros em seu avance, a ordem chegada da Santa Sé de depor imediatamente as armas, foi diligentemente obedecida. Os da Liga e os cristeros sabiam que era uma armadilha, que o Governo não respeitaria nunca o pactuado, e que entregando as armas e deixando a clandestinidade a morte era segura; o fizeram simplesmente porque o mandava a Igreja, por fidelidade. Por obediência a Igreja. Isto supôs uma larga e duríssima prova para a fé dos cristeros, que sem embargo se mantiveram fiéis a Igreja com a ajuda sobretudo dos mesmos sacerdotes que durante a guerra lhes haviam assistido.

Um comentário:

Guilherme disse...

Olá! Segundo minha interpretação do texto, há erros dos dois lados: os cristãos querendo impor o seu poder sobre o estado,a educação,a política, contra a perda dos privilégios e do outro a maçonaria entre outros acabar com o poderio católico mas acaba exagerando nas atitudes.


Fernando Rodrigues Batista

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Católico tradicionalista. Amo a Deus, Uno e Trino, que cria as coisas nomeando-as, ao Deus Verdadeiro de Deus verdadeiro, como definiu Nicéia. Amo o paradígma do amor cristão, expressado na união dos esposos, na fidelidade dos amigos, no cuidado dos filhos, na lealdade aos irmãos de ideais, no esplendor dos arquétipos, e na promessa dos discípulos. Amo a Pátria, bem que não se elege, senão que se herda e se impõe.

"O PODER QUE NÃO É CRISTÃO, É O MAL, É O DEMONIO, É A TEOCRACIA AO CONTRÁRIO" Louis Veuillot