Gustave Thibon
Marx, cuja filosofia reina hoje sobre metade do mundo, dizia que os conflitos sociais e políticos que agitam a humanidade têm por móbil a divergência dos interesses económicos. Simone Weil, comentando este pensamento, fez a seguinte observação: "Prouvesse a Deus que assim fosse. Tais conflitos não teriam então essa violência cega e esse carácter absurdo e irredutível e a sua solução seria muito mais fácil".
E Simone Weil acrescentava que em todos os conflitos humanos - desde as querelas entre indivíduos até à luta de classes e às guerras que opõem as nações - entra sempre um elemento irracional, um vento de loucura e de descomedimento que não só vai além do interesse, mas compromete o próprio interesse. Esse elemento resulta da paixão, sob a forma de instinto de agressividade, de amor-próprio mal orientado, de cólera e de ódio, de orgulho que quer, por qualquer preço, ter a última palavra, etc.
Não nego que haja conflitos de interesses. Mas estes são limitados e relativamente fáceis de resolver, enquanto a paixão não intervier. Assim que a paixão entra em jogo, deixa de ter o interesse em conta e não hesita em sacrificá-lo, para ir até ao fim do seu próprio impulso.
Não faltam os exemplos.
Conheci dois irmãos que não conseguiram nunca chegar a um entendimento sobre a partilha da herança paterna. Esta disputa apresentava todas as aparências de um conflito de interesses. Mas nenhum deles queria fazer concessões e acabaram por gastar a herança num processo judicial ruinoso, isto é, acabaram por calcar aos pés os seus respectivos interesses. 0 pretenso interesse de cada um era apenas uma máscara da teimosia e do ódio.
Acontece o mesmo em certos conflitos sociais (estou a pensar nos acontecimentos de Maio de 1968, que abalaram a economia francesa e provocaram a desvalorização da moeda) que, atiçados e envenenados pelas paixões, vêm a ser tão prejudiciais aos interesses dos
trabalhadores como aos dos que possuem riqueza.
E que dizer desses conflitos entre as nações dos quais só resultam sacrifícios humanos e ruínas económicas e os quais, no final das contas, só deixam vencidos? Napoleão, Hitler e outros autores de guerras intermináveis eram, acaso, movidos pelo interesse dos seus povos ou, mesmo, pelos seus interesses pessoais? Não. O que fizeram foi imolar os seus povos à sua ambição desordenada e sucumbiram, por fim,eles próprios, vítimas do seu apetite monstruoso de poder e domínio.
Uma sã concepção dos nossos interesses exige que dominemos as nossas paixões e que nos ponhamos de acordo com os nossos semelhantes, porque, à escala dos indivíduos como à escala das classes sociais e das nações, os interesses de todos os homens são convergentes.
A única confrontação legitima é a que consiste numa competição leal, baseada na emulação e não na inveja, a qual, multiplicando os bens postos à disposição de todos, faz coincidir o interesse particular e o interesse geral. Assim, purificadas desse veneno passional que nos cega quanto ao nosso próprio interesse e quanto ao do nosso próximo, todas as ocasiões de conflitos poderiam tornar-se motivos de colaboração e de ajuda mútua.
Era a esta verdade que Talleyrand prestava homenagem quando, depois das guerras imperiais que tinham ensanguentado e arruinado a Europa, afirmava no Congresso de Viena: "É preciso substituir as paixões que dividem pelos interesses que aproximam".
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